Maçonaria e Política 3 – o Debate em Loja


Por Eduardo Bettega
A atividade política na maçonaria é um tema controverso. A constituição de Anderson, o documento fundante da Ordem, publicado em 1723, é definitivo na condenação do debate de temas políticos e religiosos entre os maçons, pois ele divide opiniões, ameaçando a unidade.
No entanto há na irmandade um grande orgulho do passado de lutas supostamente feitas pela entidade, tanto que a data de 20 de agosto foi escolhida como o Dia do Maçom brasileiro em comemoração ao vigoroso discurso feito por Joaquim Gonçalves Ledo dentro da loja maçônica, em que ele defendeu a necessidade de se fazer a independência do Brasil.
Perigosa situação, essa, pois pode gerar desunião caso existam irmãos representantes da posição atacada. No caso, entretanto, é possível argumentar que a atitude foi correta porque a determinação de Portugal de reconduzir o Brasil à condição de colônia causaria pobreza material e espiritual, exatamente os vilões que a maçonaria não se cansa de combater.
Daí vem que enfrentar a tirania, os preconceitos e os erros, é atribuição maçônica. Porém, definir se isso se dará através do presidencialismo ou parlamentarismo, pelo rei executivo ou que atua como poder moderador, por assembleias permanentes ou pela delegação de poder, pelo capitalismo ou socialismo, é tarefa do mundo profano.
A preocupação legitimamente maçônica é que cada uma das alternativas seja exercida de forma democrática e progressista. Cabe à instituição lutar para resguardar o Estado de Direito. Assim, os irmãos têm o direito de se articular dentro de loja para combater a postura de qualquer agente político que ameace as liberdades públicas.
Essa é, de fato, a obra maçônica ao longo dos séculos. E aí está a grande separação que tanto confunde os próprios maçons, a ponto de vários deles pensarem ser tarefa da irmandade ter atuação na política partidária.
Imputar à maçonaria como instituição os atos que seus membros tomam de forma isolada é o mais grave engano a rondar a mente dos membros da Ordem. Foi por essa confusão que o Brasil só foi emancipar os negros em 1888, em vez de em 1822, como poderia ter acontecido se José Bonifácio não tivesse tido a oposição feroz do grupo maçônico rival.
Grupo maçônico rival? Isso é o reverso do que prega a maçonaria! Na verdade, não existem maçons rivais. O que existe são rivais que profanam a maçonaria levando ao seu interior as disputas por suas preferências pessoais.
Tanto é essa a realidade que é absurda a colocação: “em 1973, no Chile, a maçonaria tentou implantar o socialismo, mas em 1973, no Chile, a maçonaria impediu a implantação do socialismo”. Isso não faz sentido! Tudo muda, no entanto, quando se chega ao cerne das atitudes: “em 1973, no Chile, o maçom Salvador Allende tentou implantar o socialismo, mas o maçom Augusto Pinochet o impediu”.
Agora dá para entender! Maçons escolhem caminhos que consideram os melhores para atingir o desenvolvimento político, econômico e cultural da sociedade, mas a maçonaria como entidade não participa desse debate. E é assim porque não é sua atribuição fazer política partidária!
Daí sai o entendimento do núcleo da atividade maçônica: o maçom é um vigilante da liberdade. A atividade exige alguns atributos. Não é possível ao fiscal ser corrupto! Por isso a maçonaria é uma escola de aperfeiçoamento pessoal.
Seu dístico é derivado da Revolução Francesa. Segundo José Castelani, no livro ‘Maçonaria e Astrologia’, apesar do lema original de 1789 ser “liberdade e igualdade ou a morte”, em 1848, na 2ª República, a frase foi mudada para “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, que dessa forma foi copiada pela maçonaria. Essa é mais uma situação mítica, pois a norma é os maçons imaginarem que a bela sentença nasceu na Ordem e foi depois adotada pelos revolucionários.
Entre as características da tríade, a liberdade é a condição básica. Todo maçom precisa ser dono de seu destino, possuindo a condição social, cultural e econômica necessária para poder viver de acordo com os seus princípios.
A igualdade é desenvolvida. Na maçonaria existem ricos e pobres, extrovertidos e tímidos, eruditos e de nível médio, mas ninguém dá importância aos detalhes, pois na edificação do templo interior todos os obreiros enfrentam os mesmos desafios.
Por fim, o principal trabalho dentro da ordem maçônica é desenvolver a tolerância em relação ao semelhante. É o que gera a fraternidade.
Disso deriva que, se houver briga entre maçons, ela deve ser pautada pelas atitudes éticas de respeito mútuo. É a particularidade que distingue o mundo maçônico da existência profana: na disputa verdadeiramente fraterna, só o que vence é a Verdade.
Essa é a condição ideal, talvez na prática jamais integralmente alcançada, mas que deve ser almejada por todos que praticam os ensinamentos da Ordem. E ela é importante porque representa o fim dos ódios insanos que tanto mal fazem à humanidade. Maçons amam a Verdade e como os maçons buscam a Verdade, maçons amam-se mutuamente.
E levam esse aprendizado para a vida profana. Dessa forma o maçom torna-se um elemento irradiador de atitudes equânimes e, mesmo sem planejar, faz os que orbitam ao seu redor sentirem-se mais livres, igualitários e fraternos.
Essa obra, feita no dia a dia, é a verdadeira função da maçonaria. Todo maçom tem por resultado de sua dedicação se ver transformado na luz através da qual a humanidade se orienta na busca da vida harmônica, produtiva e prazerosa.
Poderosa atuação! Nela reside o segredo da maçonaria: é do respeito à natureza do ser humano que surge cada uma das atitudes que formam a cadeia de união onde todos podem recostar suas cabeças, porque ali encontrarão conforto para seus corpos e segurança para suas almas. 

Eduardo Bettega

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